Um gole a mais
Só mais um trago
Tanto fez
Tanto faz
É só mais um soluço
Mais um pigarro
Que sai da garganta
E espanta
O encanto da tarde
Que se esvai
Com a ressaca do mar
Que vem
Que vai
Insóbrio
No negror da noite
Que cai.
terça-feira, 13 de julho de 2010
terça-feira, 29 de junho de 2010
NOVA VELA, VELHA CARAVELA
A culpa é da vela
Que velha
Não sabe navegar
Flores para ela
Que sumiu no mar
Odoiá, Iemanjá
A velha vela
Cor de terra
Que por tanto tempo
Navegou mensagens
De fé e devoção
Em letras escarlates
Por esses mares afora
Agora
Desbotada
Descartada
Foi trocada
Por outra
Encarnada
Pomba Gira
Maria Padilha
Enfatiotada
Nova namorada
Engalanada
Vai debutar no mar
Numa velha caravela
Que inda tem
Muito a navegar
Palmas para ela
Que voltou do mar
Oxalá Iemanjá!
Que velha
Não sabe navegar
Flores para ela
Que sumiu no mar
Odoiá, Iemanjá
A velha vela
Cor de terra
Que por tanto tempo
Navegou mensagens
De fé e devoção
Em letras escarlates
Por esses mares afora
Agora
Desbotada
Descartada
Foi trocada
Por outra
Encarnada
Pomba Gira
Maria Padilha
Enfatiotada
Nova namorada
Engalanada
Vai debutar no mar
Numa velha caravela
Que inda tem
Muito a navegar
Palmas para ela
Que voltou do mar
Oxalá Iemanjá!
terça-feira, 22 de junho de 2010
NA CONTRAMÃO DA VIDA
Na contramão da vida, a miséria, com um leve sorriso de desdem, desafia o perigo e desfila por entre os carros que, alinhados em fileiras paralelas, seguem, urgentes e indiferentes, o seu curso sem sequer se aperceberem do que está acontecendo ao seu redor.
Como numa passarela, inesperada e inusitada, aquele homem negro, surgido não sei de onde, vem vindo na direção contrária, trazendo no rosto um sorriso débil que chama a atenção e segue por entre os carros, indiferente ao perigo, por toda a extensão da avenida.
O inusitado da cena deixa uma perplexidade paralisante que impede a reação de sacar da câmera para registrar aquele marcante episodio. No entanto, com certeza deverão ficar gravadas na mente de alguns que assistiram esse episódio intrigante as impressões daquilo que as retinas registraram e as emoções que esse episódio desencadeou no coração dos mais sensíveis.
Parecendo alheado de tudo, ele continuou seu desfile por entre os carros em movimento por toda a extensão da avenida, balançando displicentemente, um saco de supermercado com um objeto não identificado.
Quase desnudo, ele desfila as marcas de uma grife cujo modelito veste os tons e as formas de um mundo paralelo, cujas interseções, quando soem acontecer, deixam claros os conflitos e os antagonismos das desigualdades sociais, num mundo dividido pelo poder do dinheiro, a serviço do consumismo exacerbado e elitista.
E enquanto o homem segue peitando o perigo, os carros seguem céleres e indiferentes rumo aos seus destinos, a vida segue o seu inexorável curso... Que cada um pare e faça uma reflexão sobre os valores em que a sociedade está calcada. Talvez a partir daí possam ser encontradas as respostas para tantas questões mal resolvidas que afetam a nossa vida e nos tiram a tranquilidade.
Por tudo o que estamos assistindo todos os dias, fica cada vez mais evidente que esse universo cansou de ser invisível e quer se mostrar, se dar a conhecer para as pessoas que, por tanto tempo, passaram ao largo fingindo não ver os subterrâneos onde, como ratos, vive negando a sua humanidade, uma boa parte da população, gente como nós, que habita esse planeta chamado Terra.
Ninguém sabe quem ele é. De onde vem. Nem para onde vai. Não sabe seu nome. Nem também o porque daquele gesto tresloucado. Provavelmente ninguém vai ficar sabendo o que aconteceu com ele depois dali, a não ser que essa sua aparente brincadeira tenha tido um final trágico. Aí sim, ele vai virar manchete de revistas e jornais, que aflitas por notícias quentes, vão estampá-lo nas primeiras páginas por toda a cidade. Quem sabe nos telejornais locais e até nacionais do horário nobre da televisão. Mas então, já pode ser tarde demais!
Como numa passarela, inesperada e inusitada, aquele homem negro, surgido não sei de onde, vem vindo na direção contrária, trazendo no rosto um sorriso débil que chama a atenção e segue por entre os carros, indiferente ao perigo, por toda a extensão da avenida.
O inusitado da cena deixa uma perplexidade paralisante que impede a reação de sacar da câmera para registrar aquele marcante episodio. No entanto, com certeza deverão ficar gravadas na mente de alguns que assistiram esse episódio intrigante as impressões daquilo que as retinas registraram e as emoções que esse episódio desencadeou no coração dos mais sensíveis.
Parecendo alheado de tudo, ele continuou seu desfile por entre os carros em movimento por toda a extensão da avenida, balançando displicentemente, um saco de supermercado com um objeto não identificado.
Quase desnudo, ele desfila as marcas de uma grife cujo modelito veste os tons e as formas de um mundo paralelo, cujas interseções, quando soem acontecer, deixam claros os conflitos e os antagonismos das desigualdades sociais, num mundo dividido pelo poder do dinheiro, a serviço do consumismo exacerbado e elitista.
E enquanto o homem segue peitando o perigo, os carros seguem céleres e indiferentes rumo aos seus destinos, a vida segue o seu inexorável curso... Que cada um pare e faça uma reflexão sobre os valores em que a sociedade está calcada. Talvez a partir daí possam ser encontradas as respostas para tantas questões mal resolvidas que afetam a nossa vida e nos tiram a tranquilidade.
Por tudo o que estamos assistindo todos os dias, fica cada vez mais evidente que esse universo cansou de ser invisível e quer se mostrar, se dar a conhecer para as pessoas que, por tanto tempo, passaram ao largo fingindo não ver os subterrâneos onde, como ratos, vive negando a sua humanidade, uma boa parte da população, gente como nós, que habita esse planeta chamado Terra.
Ninguém sabe quem ele é. De onde vem. Nem para onde vai. Não sabe seu nome. Nem também o porque daquele gesto tresloucado. Provavelmente ninguém vai ficar sabendo o que aconteceu com ele depois dali, a não ser que essa sua aparente brincadeira tenha tido um final trágico. Aí sim, ele vai virar manchete de revistas e jornais, que aflitas por notícias quentes, vão estampá-lo nas primeiras páginas por toda a cidade. Quem sabe nos telejornais locais e até nacionais do horário nobre da televisão. Mas então, já pode ser tarde demais!
segunda-feira, 21 de junho de 2010
A APOSENTADORIA DA TV
Quando a televisão se cala
Na sala
Até o sofá fala
tira proza com as almofadas
bordadas com lindos motivos
de tons vivos e coloridos
floridos
De rara beleza
A mesa se revela engraçada
Faz piada com a cadeira
de madeira
Que sem timidez
na maior desfaçatez
se enrosca
e roça a perna por debaixo da toalha
Saia que veste a sua nudez
Por todo canto da casa
A descontração se instala
O tapete da sala de jantar
querendo competir com a mesa
teima em cantar
para conquistar a cadeira
que faceira se esgueira
bate o pé esperneia
machuca quem lhe anseia
se insere na brincadeira
e deixa rolar
No resto do lar
Rola solta a brincadeira
Da cozinha a chiadeira
da chaleira
avisa a todo mundo
que a água já ferveu
para quem ainda não bebeu
um café esperto
quentinho
que já começa a provocar o olfato
Ta no papo!
No quarto de dormir
a cama em sossego
também gosta do brinquedo
brinca com o travesseiro
que teima em conversar
com a camisola
que jogada
sobre a cama ainda arrumada
espera alguem perfumada
para namorar
Até a pia do banheiro
confabula com o chuveiro
querendo aproveitar
aquele momento raro
quando a casa fica em claro
e as vozes de toda idade
chegam até eles
livres e alegres
a tagarelar
Para completar
até no outro lado da casa
la nos fundos
no mundo dos excluídos
chegam os ruídos
o barulho
da balbúrdia real
natural
da casa
que liberta do imã que a escraviza
aprisiona
brinca grita
salta pula como canguru
nu de toda malícia
por entre os móveis
por todo lugar
num canto qualquer
extravasando a alegria
ouvindo todos da família
cada um a contar suas aventuras
desventuras desejos ingratidão
longe da solidão do quarto
individualizado
disfarçado pela meia luz
que reluz e reflete no rosto
a desilusão de saber que já amanheceu
Foi assim que aconteceu
da casa ressuscitar
no dia em que a TV
resolveu se aposentar.
Na sala
Até o sofá fala
tira proza com as almofadas
bordadas com lindos motivos
de tons vivos e coloridos
floridos
De rara beleza
A mesa se revela engraçada
Faz piada com a cadeira
de madeira
Que sem timidez
na maior desfaçatez
se enrosca
e roça a perna por debaixo da toalha
Saia que veste a sua nudez
Por todo canto da casa
A descontração se instala
O tapete da sala de jantar
querendo competir com a mesa
teima em cantar
para conquistar a cadeira
que faceira se esgueira
bate o pé esperneia
machuca quem lhe anseia
se insere na brincadeira
e deixa rolar
No resto do lar
Rola solta a brincadeira
Da cozinha a chiadeira
da chaleira
avisa a todo mundo
que a água já ferveu
para quem ainda não bebeu
um café esperto
quentinho
que já começa a provocar o olfato
Ta no papo!
No quarto de dormir
a cama em sossego
também gosta do brinquedo
brinca com o travesseiro
que teima em conversar
com a camisola
que jogada
sobre a cama ainda arrumada
espera alguem perfumada
para namorar
Até a pia do banheiro
confabula com o chuveiro
querendo aproveitar
aquele momento raro
quando a casa fica em claro
e as vozes de toda idade
chegam até eles
livres e alegres
a tagarelar
Para completar
até no outro lado da casa
la nos fundos
no mundo dos excluídos
chegam os ruídos
o barulho
da balbúrdia real
natural
da casa
que liberta do imã que a escraviza
aprisiona
brinca grita
salta pula como canguru
nu de toda malícia
por entre os móveis
por todo lugar
num canto qualquer
extravasando a alegria
ouvindo todos da família
cada um a contar suas aventuras
desventuras desejos ingratidão
longe da solidão do quarto
individualizado
disfarçado pela meia luz
que reluz e reflete no rosto
a desilusão de saber que já amanheceu
Foi assim que aconteceu
da casa ressuscitar
no dia em que a TV
resolveu se aposentar.
quarta-feira, 16 de junho de 2010
O Brasil e as Copas
Na fria Suécia
O Brasil esquenta a bola
Ouvido colado no rádio
O locutor a narrar
É gol...É gol...É gol
O Brasil foi la buscar
É campeão
Campeão do mundo
Sem Pelé
Mané comanda o espetáculo
Nos gramados de Santiago
Que diabo de anjo
Que diabo de pernas
Anjo torto vidas tortas
Entorta o adversário
E o Brasil passa ao largo
É bi! É BI! É bicampeão
Campeão do mundo
Pela segunda vez!
Agora ao vivo e em cores pela tevê
Noventa milhões podem ver
Em Guadalara
O mundo se render
A um canarinho do rei
Levar pra casa de vez
Um caneco que vale ouro
Em coro explode a torcida
Num grito preso na garganta
O Brasil é tricampeão!
Desde então
Só tivemos o gosto de ver
De novo o Brasil vencer
Ser campeão outra vez
Na terra do Tio Sam
Seis copas depois
A torcida se inflama
E novamente solta
O grito preso na garganta
É tetra...é tetra...é tetra!
È tetracampeão.
Depois da França
De triste lembrança
O povo senta para esperar o penta
Cada copa uma esperança
Nos anos noventa
Não ventou mais prós lado de cá
Entra o novo milênio
O Brasil tenta, tenta
E nada de penta
Técnico entra
Técnico cai
Ai meu Deus que desespero
Quem sabe o vento volte a soprar
Pró lado de cá.
Até que enfim
O povo lava a alma
Está salva a seleção
Foi buscar no distante Japão
Do outro lado do mundo
O que só ela podia fazer
Para o povo brasileiro vibrar
Soltar de vez a voz
É penta...é penta...é penta
Mais uma vez campeão
Arrebenta o coração
Já pensando no hexa
Essa foi de lascar
No caminho há uma França
Uma França no caminho
Que não deixa o Brasil passar
Essa só sabe azarar
Quando não leva
Não deixa levar
Agora aguenta coração
Solta a emoção
Vamos torcer com vontade
Hoje à tarde começa
Na terra dos orixás
Esse hexa nós vamos buscar.
O Brasil esquenta a bola
Ouvido colado no rádio
O locutor a narrar
É gol...É gol...É gol
O Brasil foi la buscar
É campeão
Campeão do mundo
Sem Pelé
Mané comanda o espetáculo
Nos gramados de Santiago
Que diabo de anjo
Que diabo de pernas
Anjo torto vidas tortas
Entorta o adversário
E o Brasil passa ao largo
É bi! É BI! É bicampeão
Campeão do mundo
Pela segunda vez!
Agora ao vivo e em cores pela tevê
Noventa milhões podem ver
Em Guadalara
O mundo se render
A um canarinho do rei
Levar pra casa de vez
Um caneco que vale ouro
Em coro explode a torcida
Num grito preso na garganta
O Brasil é tricampeão!
Desde então
Só tivemos o gosto de ver
De novo o Brasil vencer
Ser campeão outra vez
Na terra do Tio Sam
Seis copas depois
A torcida se inflama
E novamente solta
O grito preso na garganta
É tetra...é tetra...é tetra!
È tetracampeão.
Depois da França
De triste lembrança
O povo senta para esperar o penta
Cada copa uma esperança
Nos anos noventa
Não ventou mais prós lado de cá
Entra o novo milênio
O Brasil tenta, tenta
E nada de penta
Técnico entra
Técnico cai
Ai meu Deus que desespero
Quem sabe o vento volte a soprar
Pró lado de cá.
Até que enfim
O povo lava a alma
Está salva a seleção
Foi buscar no distante Japão
Do outro lado do mundo
O que só ela podia fazer
Para o povo brasileiro vibrar
Soltar de vez a voz
É penta...é penta...é penta
Mais uma vez campeão
Arrebenta o coração
Já pensando no hexa
Essa foi de lascar
No caminho há uma França
Uma França no caminho
Que não deixa o Brasil passar
Essa só sabe azarar
Quando não leva
Não deixa levar
Agora aguenta coração
Solta a emoção
Vamos torcer com vontade
Hoje à tarde começa
Na terra dos orixás
Esse hexa nós vamos buscar.
quarta-feira, 9 de junho de 2010
O MURO
Repentinamente, sem esperar a estrada acaba. Um muro cinzento e gasto pelo tempo se interpõe no caminho dando a impressão de que não há mais nada a fazer. Alto demais para escalar. Sólido demais para derrubar. Extenso demais para contornar.
Hermético não há como devassar. Nenhuma pequena fenda, uma brecha na superfície dura e áspera que permita ver o que há além. Nenhuma porta, nenhum portão que quebre a sua aparente intransponibilidade.
E o pessimismo aponta como o fim de tudo. Nada há nada que faça crer na possibilidade de uma mudança de rota que leve a algo promissor.
Tudo sugere sentar na primeira pedra do caminho e chorar. Lamentar o futuro. Recordar o que passou. E aceitar como inevitável o fim da estrada que leva ao nada. Nada parece haver além.
E o muro cego à frente consegue hipnotizar a mente que, cega, não consegue enxergar o que está tão evidente.
Mas o pouquinho de lucidez que ainda resta faz com que, enfim, perceba a realidade que se mostra de forma tão evidente e que sua mente embotada não conseguira captar e deixara escapar por tanto tempo.
E quem não fora capaz de encontrar uma saída anda agora às voltas com duas estradas, que partindo de um mesmo ponto, levam a mundos diferentes, diametralmente opostos, mas que, igualmente, atraem e chamam a atenção e nos quais quer se emaranhar para descobrir o que há depois daquele muro - um obstáculo intransponível que tanto aterroriza e ao mesmo tempo fascina e atrai.
Sem olhar para os lados, focada num mundo mais além no tempo que está por vir, sem chances de voltar, não nota que, na verdade, a estrada de mão única que parece acabar ali, apenas se bifurca.
E percebe então, com espanto, que enquanto uma leva de volta ao encontro de si mesma num tempo qualquer do passado, a outra sugere o compartilhamento das flores e dos espinhos na marcha lenta e inexorável que leva inevitavelmente ao fim do caminho.
A escolha da primeira opção é partir para uma jornada desigual na qual tanto pode ir até o fim como ficar pelo caminho, defasada enquanto a estrada, que se mostra lúdica e prazerosa, segue seu curso e abre-se para outros horizontes mais promissores. E então talvez não haja mais volta. Nenhuma chance de retomar, de recomeçar do ponto onde parara.
Um lugar aparentemente lúdico, como se fora um parque de diversão, cheio de alegres folguedos. No entanto, para que a brincadeira possa prosseguir será preciso transpor e vencer obstáculos que demandam muita paciência e aceitação. Provas de resistência e obstinação, determinação, vontade.
É optar pela pressa desenfreada dos que têm fome de viver tudo de uma só vez. Um tempo que urge, atropelando o bom senso para não ter que pensar. Na irreverência dos que se acham imortais, pegando atalhos, encurtando caminhos na ânsia de chegar não importa onde esse caminho possa levar.
Como conciliar o “ser urgente” em viver tudo na pressa do hoje que num segundo já virou ontem para dar lugar a um novo amanhã com a calma advinda da certeza que as coisas têm um tempo próprio que não adianta atropelar?
Enquanto a estrada se mostra em toda a sua ambigüidade o muro à frente lhe dá a conhecer um pouquinho dessa realidade da qual não há como fugir. Há muitos caminhos, são muitas as possibilidades de escolhas. Cada um leva a um lugar diferente cujos horizontes se mostram em sua aparência mais externa com as cores do arco-íris enfeitando e dando um colorido multifacetado à paisagem. Como um fruto que se apresenta na forma, nas cores, na textura e na aparência da sua externalidade, mas se preserva na essência só para quem ousar arriscar tudo para provar da sua integralidade.
E por mais que se queira chegar ao âmago, sempre há um muro que se interpõe e vai dosando a entrada até onde é permito ir. Fiel cão tricéfalo, verdadeiro Cérbero guardião da porta do céu ou dos infernos, dependendo do ângulo de visão, dificultando o acesso..
E é nessa ambiguidade que se apresenta a grande dificuldade das escolhas. E são elas que estão sempre presentes.
O destino a quem tanto se imputa a responsabilidade pelas desditas malditas que se apresentam na vida, não é outro senão um sinônimo de escolha.
Desde o sorvete que, diante da enorme variedade acaba-se escolhendo o de sempre, que é mais seguro, são mais certos os resultados, há menos perigo de não gostar do sabor, mesmo que os outros façam o seu apelo.
É o medo das mudanças, do desconhecido. Provar o gosto do desconhecido atrai, mas ao mesmo tempo aterroriza. Feliz de quem tem a coragem de arriscar. Escolher uma estrada e seguir por ela até o fim ou mudar de rumo, corrigir o curso sempre que for preciso, mas nunca desistir.
Como seria bom poder se amparar na imaturidade das crianças que batem o pé até conseguir ter tudo ao mesmo tempo. Não ter que escolher entre coisas diferentes mas igualmente queridas e desejadas. Não precisar viver a incerteza da opção feita entre pegar um atalho para chegar logo ou ir pelo caminho mais longo, porém de rota conhecida que garanta a chegada em segurança.
Não ter que imaginar pela vida afora o que teria sido se outra tivesse sido a escolha. O que teria acontecido? O que teria vivido? Como estaria agora?
Mas aquele muro não deixa ir além do caminho que vinha trilhando sempre. Quando ele se interpõe a única solução é traçar nova rota, escolher outra direção.
Na contramão da história ou seguindo o fluxo natural que foi indicado como o mais sensato.
Nesse instante entra um outro elemento na escolha. A sensatez. O bom senso. Frutos da razão que sempre está em rota de colisão com o coração.
Da introdução desses dois elementos historicamente antagônicos percebe-se que essa escolha não é assim tão fria quanto aparenta. Esses caminhos levam direto ao coração que está falando alto tentando se sobrepor à razão que não quer e nem pode negar a sua origem.
Adivinhar o futuro, prever o que virá...quem há de conseguir essa proeza nessa vida!
Essa história não acaba aqui. Ela fica pelo meio do caminho...dos caminhos que estão sendo trilhados ao mesmo tempo. Um pouco nesse...um caminho que sabe de antemão não vai dar em nada...brincando de viver o hoje...carpe diem sem pensar no depois
Um pouco no outro...tentando construir uma ponte para o futuro, um futuro que nem sabe se há de vir. Um agasalho para proteger o corpo do vento frio do outono. Mas aqui não há outono. Um calor para trocar e aquecer do frio do inverno. Uma sombra pára refrescar nas tardes modorrentas sob o sol inclemente do verão. Uma alegria pra dividir nas frescas e perfumadas manhãs de primavera em flor. Um abrigo para a chuva que vai cair sobre as nossas cabeças.
Antes que anoiteça e se aborreça. Não esqueça. Pode ser que nada disso aconteça.
No meio do caminho tem uma pedra!
Uma pedra no meio do caminho.
Como bem disse o poeta.
Alertas
Despertas
As estradas também ficam desertas!
Hermético não há como devassar. Nenhuma pequena fenda, uma brecha na superfície dura e áspera que permita ver o que há além. Nenhuma porta, nenhum portão que quebre a sua aparente intransponibilidade.
E o pessimismo aponta como o fim de tudo. Nada há nada que faça crer na possibilidade de uma mudança de rota que leve a algo promissor.
Tudo sugere sentar na primeira pedra do caminho e chorar. Lamentar o futuro. Recordar o que passou. E aceitar como inevitável o fim da estrada que leva ao nada. Nada parece haver além.
E o muro cego à frente consegue hipnotizar a mente que, cega, não consegue enxergar o que está tão evidente.
Mas o pouquinho de lucidez que ainda resta faz com que, enfim, perceba a realidade que se mostra de forma tão evidente e que sua mente embotada não conseguira captar e deixara escapar por tanto tempo.
E quem não fora capaz de encontrar uma saída anda agora às voltas com duas estradas, que partindo de um mesmo ponto, levam a mundos diferentes, diametralmente opostos, mas que, igualmente, atraem e chamam a atenção e nos quais quer se emaranhar para descobrir o que há depois daquele muro - um obstáculo intransponível que tanto aterroriza e ao mesmo tempo fascina e atrai.
Sem olhar para os lados, focada num mundo mais além no tempo que está por vir, sem chances de voltar, não nota que, na verdade, a estrada de mão única que parece acabar ali, apenas se bifurca.
E percebe então, com espanto, que enquanto uma leva de volta ao encontro de si mesma num tempo qualquer do passado, a outra sugere o compartilhamento das flores e dos espinhos na marcha lenta e inexorável que leva inevitavelmente ao fim do caminho.
A escolha da primeira opção é partir para uma jornada desigual na qual tanto pode ir até o fim como ficar pelo caminho, defasada enquanto a estrada, que se mostra lúdica e prazerosa, segue seu curso e abre-se para outros horizontes mais promissores. E então talvez não haja mais volta. Nenhuma chance de retomar, de recomeçar do ponto onde parara.
Um lugar aparentemente lúdico, como se fora um parque de diversão, cheio de alegres folguedos. No entanto, para que a brincadeira possa prosseguir será preciso transpor e vencer obstáculos que demandam muita paciência e aceitação. Provas de resistência e obstinação, determinação, vontade.
É optar pela pressa desenfreada dos que têm fome de viver tudo de uma só vez. Um tempo que urge, atropelando o bom senso para não ter que pensar. Na irreverência dos que se acham imortais, pegando atalhos, encurtando caminhos na ânsia de chegar não importa onde esse caminho possa levar.
Como conciliar o “ser urgente” em viver tudo na pressa do hoje que num segundo já virou ontem para dar lugar a um novo amanhã com a calma advinda da certeza que as coisas têm um tempo próprio que não adianta atropelar?
Enquanto a estrada se mostra em toda a sua ambigüidade o muro à frente lhe dá a conhecer um pouquinho dessa realidade da qual não há como fugir. Há muitos caminhos, são muitas as possibilidades de escolhas. Cada um leva a um lugar diferente cujos horizontes se mostram em sua aparência mais externa com as cores do arco-íris enfeitando e dando um colorido multifacetado à paisagem. Como um fruto que se apresenta na forma, nas cores, na textura e na aparência da sua externalidade, mas se preserva na essência só para quem ousar arriscar tudo para provar da sua integralidade.
E por mais que se queira chegar ao âmago, sempre há um muro que se interpõe e vai dosando a entrada até onde é permito ir. Fiel cão tricéfalo, verdadeiro Cérbero guardião da porta do céu ou dos infernos, dependendo do ângulo de visão, dificultando o acesso..
E é nessa ambiguidade que se apresenta a grande dificuldade das escolhas. E são elas que estão sempre presentes.
O destino a quem tanto se imputa a responsabilidade pelas desditas malditas que se apresentam na vida, não é outro senão um sinônimo de escolha.
Desde o sorvete que, diante da enorme variedade acaba-se escolhendo o de sempre, que é mais seguro, são mais certos os resultados, há menos perigo de não gostar do sabor, mesmo que os outros façam o seu apelo.
É o medo das mudanças, do desconhecido. Provar o gosto do desconhecido atrai, mas ao mesmo tempo aterroriza. Feliz de quem tem a coragem de arriscar. Escolher uma estrada e seguir por ela até o fim ou mudar de rumo, corrigir o curso sempre que for preciso, mas nunca desistir.
Como seria bom poder se amparar na imaturidade das crianças que batem o pé até conseguir ter tudo ao mesmo tempo. Não ter que escolher entre coisas diferentes mas igualmente queridas e desejadas. Não precisar viver a incerteza da opção feita entre pegar um atalho para chegar logo ou ir pelo caminho mais longo, porém de rota conhecida que garanta a chegada em segurança.
Não ter que imaginar pela vida afora o que teria sido se outra tivesse sido a escolha. O que teria acontecido? O que teria vivido? Como estaria agora?
Mas aquele muro não deixa ir além do caminho que vinha trilhando sempre. Quando ele se interpõe a única solução é traçar nova rota, escolher outra direção.
Na contramão da história ou seguindo o fluxo natural que foi indicado como o mais sensato.
Nesse instante entra um outro elemento na escolha. A sensatez. O bom senso. Frutos da razão que sempre está em rota de colisão com o coração.
Da introdução desses dois elementos historicamente antagônicos percebe-se que essa escolha não é assim tão fria quanto aparenta. Esses caminhos levam direto ao coração que está falando alto tentando se sobrepor à razão que não quer e nem pode negar a sua origem.
Adivinhar o futuro, prever o que virá...quem há de conseguir essa proeza nessa vida!
Essa história não acaba aqui. Ela fica pelo meio do caminho...dos caminhos que estão sendo trilhados ao mesmo tempo. Um pouco nesse...um caminho que sabe de antemão não vai dar em nada...brincando de viver o hoje...carpe diem sem pensar no depois
Um pouco no outro...tentando construir uma ponte para o futuro, um futuro que nem sabe se há de vir. Um agasalho para proteger o corpo do vento frio do outono. Mas aqui não há outono. Um calor para trocar e aquecer do frio do inverno. Uma sombra pára refrescar nas tardes modorrentas sob o sol inclemente do verão. Uma alegria pra dividir nas frescas e perfumadas manhãs de primavera em flor. Um abrigo para a chuva que vai cair sobre as nossas cabeças.
Antes que anoiteça e se aborreça. Não esqueça. Pode ser que nada disso aconteça.
No meio do caminho tem uma pedra!
Uma pedra no meio do caminho.
Como bem disse o poeta.
Alertas
Despertas
As estradas também ficam desertas!
quinta-feira, 27 de maio de 2010
Tudo acontece
Quando parece que não vai dar em nada
Tudo acontece na nossa estrada
Bate uma emoção
Da no coração
Tudo favorece
Um clima de tesão
Do chão pro infinito
Dito por não dito
É como mágica
Tudo tão bonito!
Quando parece que não vai dar em nada
Tudo acontece na nossa estrada
O triste fica nulo
Nossa cama fala
Desejo prevalece
Até o tempo para
Vem o amanhecer
Do céu volta a chover
Pingos de suor
Cheiro de prazer
Quando parece que não vai dar em nada
Tudo acontece na nossa estrada
Brincando na estação
Estação da flor
O corpo se aquece
Na troca de calor
A luz pela janela
O tempo a despertar
Tempo que passou
Sem ninguém notar
Quando parece que não vai dar em nada
Tudo acontece na nossa estrada
Saudando a alvorada
O pássaro cantor
O canto fortalece
O amável amor
Juntando a beleza
De toda a natureza
Não vai caber
Aqui na nossa mesa!
Tudo acontece na nossa estrada
Bate uma emoção
Da no coração
Tudo favorece
Um clima de tesão
Do chão pro infinito
Dito por não dito
É como mágica
Tudo tão bonito!
Quando parece que não vai dar em nada
Tudo acontece na nossa estrada
O triste fica nulo
Nossa cama fala
Desejo prevalece
Até o tempo para
Vem o amanhecer
Do céu volta a chover
Pingos de suor
Cheiro de prazer
Quando parece que não vai dar em nada
Tudo acontece na nossa estrada
Brincando na estação
Estação da flor
O corpo se aquece
Na troca de calor
A luz pela janela
O tempo a despertar
Tempo que passou
Sem ninguém notar
Quando parece que não vai dar em nada
Tudo acontece na nossa estrada
Saudando a alvorada
O pássaro cantor
O canto fortalece
O amável amor
Juntando a beleza
De toda a natureza
Não vai caber
Aqui na nossa mesa!
sexta-feira, 14 de maio de 2010
AUTO (IN)DEFINIÇÃO
Minha mãe pariu em mim
o começo de um novo dia
e o primeiro dia de uma nova vida
Pariu em mim
o sol
o dia
o alvorecer
e eu sou
a lua
a noite
o escurecer.
o começo de um novo dia
e o primeiro dia de uma nova vida
Pariu em mim
o sol
o dia
o alvorecer
e eu sou
a lua
a noite
o escurecer.
sexta-feira, 30 de abril de 2010
GARRAFAS DE NÁUFRAGOS
Aturdida com a profusão de luz projetada nas minhas retinas ocasionada pelo reflexo do sol no imenso espelho de verdes águas salgadas senti de repente a sensação de irrealidade que me projetou para uma terra de sonhos numa época onde ainda se podia viver grandes aventuras marítimas.
Pairava na manhã um excesso de luz que dava tons irreais aos cenários como se uma bruma de fumaça esbranquiçada dissipasse as sombras e atenuasse os contornos criando um cenário surreal onde as coisas nem sempre são o que aparentam ser.
Ambiente propício para sonhar, viajar mundos estranhos, há muito pressentidos em recriações do cinema ou descrição em livros. Sempre imaginados e desejados.
A ilusão então se instala ao sabor da imaginação.
O hábito, a muito tempo cultivado, de catar conchinhas do mar e vibrar a cada tesouro descoberto como se fora uma raridade e de me embevecer ante a beleza de cada detalhe - nuanças de cores, profusão de formas, conduziu-me por mundos de magia e encantamento que desde os meus tempos de criança me fascinam nas histórias que costumava ler, pelo conteúdo cheio de alusões a aventuras e romances.
Ficar olhando o mar e sonhar com piratas a procura de tesouros. Andar pela praia na esperança de encontrar, ali jogada na areia, bem ao meu alcance, uma velha garrafa do mar, com mensagens de náufragos em busca de ajuda ou recados de amantes desesperados, desafiando o tempo e atravessando mares até um porto seguro para ancorar na praia. Impunemente. Sem ter cumprido a sua missão. Ou será que a sua missão ainda não acabou? Será que ainda hoje existem náufragos que se utilizam desse método tão inusitado para se comunicar em pleno domínio do e-mail ?
Tomada de visível emoção abro a garrada com cuidado, para não danificar seu precioso conteúdo. E aos poucos vou penetrando naquele mundo distante no tempo e no espaço ali descrito em palavras simples de apelo ou em rebuscadas declarações de amor. Me vejo então senhora daquele segredo por tanto tempo guardado e me impressiono ao pensar o que terá acontecido com aqueles que por ela tanto esperaram em vão. Senhora também dos seus destinos. Estimo quanto era importante que aquele apelo, seja ele de amor ou um pedido de socorro, chegasse ás mãos certas na hora certa. Tempo e espaço fazendo a diferença.
Ai as garrafas de náufragos! Como me fascinam!
Num momento de distração deixo a garrafa escorregar e o estalido de vidro quebrando ao tocar o chão me trazem de volta à realidade.
E o que vejo então me deixa cheia de ternura e contentamento. Aberta em minhas mãos duas folhas de papel de delicada textura com uma letra miúda e caprichada que sugere toda a delicadeza e requinte de uma época que já não tem espaço nesse mundo das coisas práticas e urgentes. E à proporção que vou lendo meu peito se enche de uma grande felicidade e sinto vontade de me fazer digna e merecedora daquele momento único que a vida, já no seu ocaso, ainda está me proporcionando.
Uma carta para mim. Se não fosse o preconceito eu diria “uma carta de amor”. Uma carta tão bonita e verdadeira. Uma carta que me fez voltar a viver a vida com o sentimento de transcendência. Atemporal. Universal.
Buscando sempre a essência na transparência dos sentimentos verdadeiros que por isso se perpetuam na mente e nos corações enamorados.
Ai os náufragos e suas garrafas!
Ai as cartas...quem disse que são ridículas?
Quem nunca as escreveu
Quem nunca as recebeu.
Pairava na manhã um excesso de luz que dava tons irreais aos cenários como se uma bruma de fumaça esbranquiçada dissipasse as sombras e atenuasse os contornos criando um cenário surreal onde as coisas nem sempre são o que aparentam ser.
Ambiente propício para sonhar, viajar mundos estranhos, há muito pressentidos em recriações do cinema ou descrição em livros. Sempre imaginados e desejados.
A ilusão então se instala ao sabor da imaginação.
O hábito, a muito tempo cultivado, de catar conchinhas do mar e vibrar a cada tesouro descoberto como se fora uma raridade e de me embevecer ante a beleza de cada detalhe - nuanças de cores, profusão de formas, conduziu-me por mundos de magia e encantamento que desde os meus tempos de criança me fascinam nas histórias que costumava ler, pelo conteúdo cheio de alusões a aventuras e romances.
Ficar olhando o mar e sonhar com piratas a procura de tesouros. Andar pela praia na esperança de encontrar, ali jogada na areia, bem ao meu alcance, uma velha garrafa do mar, com mensagens de náufragos em busca de ajuda ou recados de amantes desesperados, desafiando o tempo e atravessando mares até um porto seguro para ancorar na praia. Impunemente. Sem ter cumprido a sua missão. Ou será que a sua missão ainda não acabou? Será que ainda hoje existem náufragos que se utilizam desse método tão inusitado para se comunicar em pleno domínio do e-mail ?
Tomada de visível emoção abro a garrada com cuidado, para não danificar seu precioso conteúdo. E aos poucos vou penetrando naquele mundo distante no tempo e no espaço ali descrito em palavras simples de apelo ou em rebuscadas declarações de amor. Me vejo então senhora daquele segredo por tanto tempo guardado e me impressiono ao pensar o que terá acontecido com aqueles que por ela tanto esperaram em vão. Senhora também dos seus destinos. Estimo quanto era importante que aquele apelo, seja ele de amor ou um pedido de socorro, chegasse ás mãos certas na hora certa. Tempo e espaço fazendo a diferença.
Ai as garrafas de náufragos! Como me fascinam!
Num momento de distração deixo a garrafa escorregar e o estalido de vidro quebrando ao tocar o chão me trazem de volta à realidade.
E o que vejo então me deixa cheia de ternura e contentamento. Aberta em minhas mãos duas folhas de papel de delicada textura com uma letra miúda e caprichada que sugere toda a delicadeza e requinte de uma época que já não tem espaço nesse mundo das coisas práticas e urgentes. E à proporção que vou lendo meu peito se enche de uma grande felicidade e sinto vontade de me fazer digna e merecedora daquele momento único que a vida, já no seu ocaso, ainda está me proporcionando.
Uma carta para mim. Se não fosse o preconceito eu diria “uma carta de amor”. Uma carta tão bonita e verdadeira. Uma carta que me fez voltar a viver a vida com o sentimento de transcendência. Atemporal. Universal.
Buscando sempre a essência na transparência dos sentimentos verdadeiros que por isso se perpetuam na mente e nos corações enamorados.
Ai os náufragos e suas garrafas!
Ai as cartas...quem disse que são ridículas?
Quem nunca as escreveu
Quem nunca as recebeu.
quinta-feira, 29 de abril de 2010
Um arco-iris de emoções
Quando a lua de prata invadiu o azul do nosso céu, o mar em verdes ondulações embalava o nosso momento de encantamento, embevecidos pelo doce mistério de viver as alegrias e incertezas da descoberta.
O sol, oculto pelos coqueiros que despontam por trás das toscas construções que nos dão tão doce acolhida, avermelhou o fim da tarde que arde em nossos corações e põe em brasa as nossas entranhas. Estranhas emoções!
Antes de morrer no negror da noite que preguiçosamente se instala, o sol lança seus raios sobre nós e o mais poderoso deles vem atingir em cheio as duas luas que brincam no seu rosto mostrando a pureza do cristal do doce e profundo mel dos seus olhos.
Como duas gemas preciosas do mais puro quilate, dissipam a luz, furtam a cor e acendem num lampejo o meu desejo e eu vejo refletidas as incertezas e inquietudes do querer e do gostar e o que vejo no mar refletido em seus olhos cor de mel me atrai tão irresistivelmente que me sinto irremediavelmente mergulhando até o fundo de mim mesma sem querer respostas para questões que eu não sei explicar.
Então, vencida pela beleza desse instante, me quedo silenciosamente perdida na beleza e mistério do teu olhar.
segunda-feira, 29 de março de 2010
A CAÇADORA DE MORCEGOS
Estava em pleno semestre letivo e a solução encontrada para que ela não ficasse prejudicada nos estudos quando o seu pai teve que voltar para a cidade de onde viera a menos de três anos atrás, para assumir um novo emprego, foi deixá-la na casa de algum parente ou amigo, como já acontecera em outras ocasiões.
E a escolha dessa vez recaiu naturalmente sobre alguém da família, uma tia da mãe que morava com a filha e o genro num sobrado antigo na cidade de Caicó, no Rio Grande do Norte.
E foi na casa dela que, alem de ter que conviver com os constantes e terríveis conflitos que o trio protagonizava diariamente, ela ainda teve que se envolver em uma aventura noturna e solitária que muito a incomodou.
Ainda sob o efeito traumático de mais uma separação brusca da família, cheia de saudades e temores pelo começo de uma nova etapa da sua vida, numa casa estranha com pessoas com quem ela não tinha a menor intimidade, apesar do ligeiro parentesco, ela acomodou-se discretamente chorosa na intimidade do seu quarto onde pretendia ter uma noite tranquila de sono para enfrentar o dia seguinte em outro ambiente estranho e atribulado, como já dera pra perceber.
Mas o seu sono que pretendia ser tranquilo foi quebrado bruscamente pelo desagradável e inesperado impacto de um objeto frio e mole sobre o seu corpo. Em meio ao susto e sem entender direito o que estava se passando imediatamente pulou e, ainda ofuscada pela luz do quarto que atabalhoadamente acendera, passou a sacudir a rede com violência e decisão para expulsar o que havia caído sobre ela e devia estar ainda acomodado no fundo da rede agora vazia.
Com esse movimento ela deu de cara com um ser estranho meio rato meio pássaro de pele escura que, atordoado pela ligeireza e violência do contra-ataque, jazia imóvel esparramado no chão do quarto. Um bicho que ela logo identificou como sendo um morcego. E pensar que esse ser abjeto e nojento caiu do céu direto na minha rede, em cima de mim? Ai que horror!
Coitadinhos dos morcegos! Tão importantes e tão injustiçados, pois apesar de contribuirem substancialmente para o equilíbrio dos ecossistemas de quase todo o planeta Terra, uma vez que só não são encontrados nos pólos, são temidos e e causam nojo e asco nas pessoas por puro preconceito e desconhecimento.
Coitadinhos dos morcegos! Tão importantes e tão injustiçados, pois apesar de contribuirem substancialmente para o equilíbrio dos ecossistemas de quase todo o planeta Terra, uma vez que só não são encontrados nos pólos, são temidos e e causam nojo e asco nas pessoas por puro preconceito e desconhecimento.
O céu a que ela aludia era o telhado do sobrado antigo que sem ser forrado, reunia as condições ideais - um vão imenso entre o chão e a cumeeira do telhado do casarão - um verdadeiro paraíso para os morcegos que se dependuram nas linhas e caibros durante o dia para de noite praticarem os seus vôos rasantes pelo quarto, sendo que um terminou desastradamente numa aterrissagem forçada sobre a rede armada bem no meio do imenso quarto onde ela iria dormir durante todo o tempo em que permanecesse naquela casa.
No susto ela sentia que do chão ele parecia lhe olhar, com um olhar de quem estuda o inimigo para depois desferir um golpe certeiro e mortal.
Agora um pouco mais calma pela imobilidade momentânea do bicho, ela começou a tomar as rédeas da situação, ao mesmo tempo que se dava conta do absurdo do seu pensamento, pois sempre soubera que morcego não enxerga e se move guiado pelo eco dos sons que emite constantemente e que volta para eles quando interceptam um obstáculo e os guia como o sonar o faz com o submarino. Então como ele podia estar lhe fitando ameaçadoramente? Fruto do medo paralisante..
Isso tudo se passou num átimo de segundo até ela vencer o pavor que estava sentindo daquela criatura protagonista de tantas histórias e lendas que povoam o imaginário das crianças pelos interiores e que compõem o folclore de talgumas regiões desse nosso imenso país e que estava ameaçando paralisá-la deixando-a a mercê das atitudes dele, o que não era nada bom pra ela.
Imagina se ele resolve passar a noite treinando voos rasantes e aterrissagens forçadas instituindo para isso, o seu quarto como aeroporto improvisado e fizesse da sua rede uma pista de pouso?
Foi pensando nisso que ela se armou de todo restinho de coragem que ainda possuía e partiu para a eliminação da nave derrubada enquanto o visitante inoportuno, um ialienígena, um verdadeiro intruso que invadira sua vida assim tão de repente, bem ela ali se instalara, continuava atordoado sendo portanto alvo fácil para as certeiras chineladas daquela guerreira disfarçada de garota, e que começaram meio tímidas e amedrontadas para depois, vendo que não havia reação por parte da vítima, ganharem coragem e força e se transformarem em fúria desenfreada. Sede de vingança pela audácia do morcego em vir perturbar seu sono daquela forma tão assustadora.
Nessa ocasião ela nem se deu conta que o intruso alí não era bem ele ,que há muito habitava aquele espaço que ela sem querer invadira!
Nessa ocasião ela nem se deu conta que o intruso alí não era bem ele ,que há muito habitava aquele espaço que ela sem querer invadira!
Mas ela só sossegou e voltou a dormir quando o viu ali no chão completamente destroçado e morto, esperando que o dia amanhecesse para ser “rebolado no mato”, o que no linguajar local da época, ano de mil novecentos e sessenta e seis, significava ser descartado solenemente em qualquer lugar da rua ou do quintal da casa. Sem nenhum pudor ou preocupação com o ecologicamente correto que ainda estava longe de existir por aquelas bandas.
Pensando que com isso encerrava aquele episódio que julgava único, isolado e desagradável da sua noite de estréia no sobrado, diga-se de passagem, uma estranha forma de dar as boas vindas no meio da noite a alguém que acabara de chegar, parecendo mais com trote idiota de veteranos pra cima de calouros, ela voltou para o aconchego da rede onde continuou a dormir até o cantar do galo e o cheiro de café ao amanhecer fazê-la despertar para o primeiro dia na casa em mais uma nova e provisória fase da sua vida.
Qual o que! Doce ilusão. A caçada estava só começando. Ainda muitas lutas para vencer. Muitas batalhas diurnas que ela iria presenciar na casa entre os três membros da família dariam a essa menina ainda adolescente mais um estágio para a conclusão do curso “Como passar incólume por uma guerra doméstica” que lhe concederia um diploma extracurricular de extrema importância para toda a sua vida.
Era um “triunvirato” de brigas. Brigava a mãe com a filha. A filha com o marido. E a sogra com o genro. Era uma guerra de titãs. Se fossem partir para a agressão física poderia sair dali um campeão de Sumô, tal o peso pesado que eles eram.
E ela chochinha, acanhada, assustada com aquilo que não compreendia muito bem teve de rapidamente se adaptar a tudo e tentar passar incólume por aquela guerra que não lhe pertencia e que, com a graça de Deus, ela em breve deveria deixar para trás como mais um triste aprendizado. Inevitável, o chamado “mal necessário”, uma vez que não havia outro jeito. Era tirar o melhor proveito possível de tudo que estava passando ali e em outras ocasiões semelhantes por toda a sua infância, adolescência e juventude, para poder aplicar depois..
O que ela não sabia era que logo, logo ela seria instada a por em prática tudo o que aprendera até então na arte milenar dos chineses, aquela representada pelos três macaquinhos.
Enquanto isso a noite lhe reservava uma surpresa, uma nova batalha nessa guerra que parecia ter se instalado na sua vida.
Ela não podia imaginar que em outro front ela teria também que enfrentar uma guerra noturna e particular contra o ataque dos morcegos que começou logo na primeira noite e teve muitos episódios até a batalha final.
Pior que logo na noite seguinte, com tristeza e uma certa raiva, ela pode constatar que aquele primeiro ataque não fora um episódio único e isolado nem era algo fortuito mas ainda se repetiria muitas vezes.
Essa triste constatação a fez perceber que ela teria daí em diante que ter muita coragem e audácia para enfrentar e vencer os ataquesse noturnos e se preparar para minimizar os efeitos daquelas batalhas sobre as suas noites de forma a não perturbar o seu sono e não ter reflexos negativos sobre os seus estudos.
Foi então que, para não ter que ficar a noite toda de plantão esperando a hora do ataque, ela desenvolveu uma técnica muito interessante. Dormia sob as cobertas com o lençol esticado da cabeça aos pés de forma que quando ele aterrissava batia no lençol esticado que o catapultava pelo quarto fazendo-o cair no chão já atordoado dando tempo para ela se levantar, acender a luz e matá-lo a chineladas. Sem chances de reação de fuga.
E pela manhã mais um cadáver de morcego estendido no chão era a única testemunha muda do que se passara naquele quarto entre uma serial killer e as suas vítimas; os morcegos audazes. E ela então com ares de vencedora atravessava a casa toda triunfantemente carregando aquele minúsculo cadáver pelas pontas dos dedos e o rebolava no fundo do quintal da casa. Esfregando as mãos de contentamento ela corria para o banheiro onde fazia a sua toillette du matin antes de ir para o colégio.
E podia comemorar mais uma batalha ganha das cento e vinte e duas travadas nas noites que ela passou naquele sobrado. Cento e vinte duas batalhas creditadas na sua conta de caçadora de morcegos. Cento e vinte e dois extermínios de espécimes representantes da Ordem Chiroptera debitados na conta da futura ambientalista.
Hoje ao relembrar esse episódio com um certo distanciamento mostrando que os reflexos psicológicos de tudo isso foram absorvidos e já não causam traumas e ressentimentos, ela comenta, com aquele humor que lhe é tão peculiar, não saber quem vai pagar a conta pelo desequilíbrio ecológico que a sua atitude de caçadora de morcego possa ter causado na natureza. Afinal foram aproximadamente cento e vinte e dois morcegos exterminados em um espaço de pouco mais de quatro meses.
Mas se for assim, diz ela, eu também deveria pedir a conta das noites de sono mal dormidas que eles me fizeram passar. Só que não sei a quem ou o que deveria acionar para isso.
Então põe na conta das almas, como se costuma dizer.
E damos por encerrado esse episódio que seria trágico se não fosse tão cômico. Caçadora de morcegos, pois sim! Eu em!!!
É o fim!
domingo, 28 de março de 2010
DE LUIZ EM LUIZ
Enquanto estava sentada ali naquela varanda frente ao mar, durante aqueles dias de começo de ano, por mais que tentasse não conseguia ficar indiferente. Ele chamava para si a atenção de todos. E no esforço de acompanhar a sua movimentação constante e irrequieta de quem não sabe ficar parado, que não sossega a mente nem quando parece dormir, ficava imaginando, tentando penetrar nessa cabeça que mesmo parecendo alheada, ferve de curiosidade de saber das coisas no tempo instante em que estão acontecendo.
Mas a sua controvertida personalidade se mostra na medida em que da mesma forma que ele parece estar sempre plugado com o que acontece la fora, possui um mundo próprio e particular, para onde acorre quando, aborrecido com a pequenez de tudo a sua volta, some para nele se refugiar, se aquieta parecendo inane como uma larva em seu casulo de onde, à mais leve provocação, parte como foguete para o ataque muitas vezes mortal quando feito bomba de puro (hidro)gênio explode em uma enxurrada de palavras ferinas e cortantes como vidro que, ao se partir em milhões de pedaços, desintegra as coisas que estão ao seu redor aquecendo a temperatura ambiente ao máximo de calor como uma fusão nuclear produzindo a energia que faz as estrelas brilharem.
A impressão que me da é que ele não é um, são muitos. Um só não da conta. Onipresente está em tudo que acontece numa distância que a sua perna sabe sempre alcançar na velocidade do raio que na ficção foi alcançada pelo não menos famoso e ágil The Flash.
Anoitece, está na balada. Amanhece, zanza pela praia a descobrir o que a escuridão complacente da noite escondeu e a claridade do sol inclemente está a revelar e ele quer saber. Por isso de manhã eu olhava la estava ele. Serelepe. Fuçando, farejando rastros de coisas. A impressão que eu tinha então era que ele não dormira na noite anterior. Aliás, o que deixa transparecer é que nunca dorme. Talvez finja dormir, por vezes até ronque só para enganar, irritar quem estiver por perto, mas dormir mesmo, com os dois olhos fechados, corpo relaxado, desguarnecido, alheio a tudo que possa acontecer...ah! Isso eu não acredito que faça. .Talvez com um olho fechado e o outro parecendo dormir, mas sempre pronto pra registrar qualquer ocorrência que renda algumas boas fofocas no dia seguinte!
Quando parece estar enfurnado no quarto remexendo nas coisas ao redor, ele surpreende voltando de algum lugar, de um canto qualquer resguardado do olhar indiscreto de todos, mas que para ele se desvenda aos seus sentidos aguçados de lince, que se atiçam a qualquer sinal de alvoroço. Aí ele sorrateiro sai de cena para retornar cheio de histórias ricas de detalhes, que ele trata de apimentar com a sua fértil e maliciosa imaginação.
E sempre volta trazendo consigo rastos e sinais dessas outras cenas vividas nos bastidores, que exibe como troféus, mudos testemunhos das suas incursões solitárias em lugares nunca dantes navegados.
Algum objeto que resgatou dos escombros de uma demolição ou do rescaldo de algum incêndio que provocou sabe-se la onde e que, com um bom trato, não farão feio em qualquer ambiente.
Fotos de pessoas interessantes e exóticas que ele mesmo tirou com sua câmera maravilhosa que passou da hora e não serve mais e agora jaz num canto qualquer do quarto, como algo que perdeu a vez, já fez a sua hora (honra e glória), cumpriu a sua missão e segue seu destino incerto. Até que, como uma onda, volte à crista e seja de novo entronizada como a bola da vez.
Olhe o que ele fez!. Ferida de morte a câmera de milhões de dólares que ainda lhe custa os olhos da cara todo mês, nas prestações escrachantes ainda não pagas, já não empolga o menino que curioso e ávido de novas conquistas rejeita a enferma num leito de morte e vira-se para seu novo brinquedo. Um novo enredo.
E a culpa é sempre de alguém a quem foi confiada a guarda e não zelou. Deixou cair. Descuidou. Quebrou. Inutilizou seu brinquedinho. Padrastos. São como ratos. Não quero mais saber. Diz injuriado.
Às vezes aparece com lindas e raras peças esculpidas. Cupidos atirando flechas. Santos milagreiros do Juazeiro verdadeiras obras de arte. Presentes de um artesão com quem fez amizade no bar da esquina onde bebia cachaça com limão ao som de Valdick Soriano cantando “eu não sou cachorro não”. Pode? Coisas de Luiz! Todo mundo diz.
Quando não, alguma peça de roupa que garimpou em meio ao cascalho de coisas sem valor jogadas em um brechó do centro, na esquina da praça, quase de graça! Uma pechincha. Palavra de quem entende. Nem tive dúvidas, bastou por os olhos em cima... Imagina se eu ia perder! Deixar pra trás uma jóia dessas no meio de tanta quinquilharia. Quem diria! Ela pedia para ser resgatada. Mesmo sem dinheiro, pois a mixaria que eu tinha colocado no bolso de trás da calça para uma necessidade, quando tarde da noite já meio melado quisesse tomar um caldo de peixe (por favor, me deixe!) perdi quando puxei um papel que tinha guardado com o telefone do moto-taxista que eu chamei pra me levar até a casa de um amigo pois estava chovendo e eu tinha esquecido de levar o guarda-chuva aquele que eu ganhei de uma amiga em Paris o ano passado quando fomos passear na Praça da Concórdia essa minha amiga que por sinal tem um namorado que gosta de tomar xerez e onde eu fiquei até o fim do mês eu não sei o que ele fez só sei que quando eu procurei o dinheiro não achei nenhum real fiquei muito mal pois não ia poder pagar a conta da corrida, (que eu faço da vida), ainda assim comprei.
Ufa! Cansei!.
Esse lenço de seda, você nem imagina, tava largado, como algo sem valor. Da para tirar a maior onda assim jogado no pescoço, meio por acaso, não fica um arraso Beth? Ei Beth to falando com você ingrata, vê se se resolve e sai dessa pois você nem ata e nem desata. Que chata!
O chapéu em que ninguém reparava, não ficou massa? Chocante não é mulher? Dão um toque especial ao meu estilo e fazem a diferença. Não tem uma presença?
Tantas coisas acontecendo, pessoas interessantes que ele vive a encontrar pelos cantos, recantos dessa cidade que parece dominar tão bem, transitando entre tantos mundos, de reis a vagabundos, Vicentes, Raimundos...Vitórias, histórias que vivencia de formas diferentes, mas sempre contadas com tantos detalhes que da assunto pra mais de um mês.
Entrou pela perna do pato, saiu pela perna do pinto, o rei mandou dizer, que quem quiser que conte cinco. Um, dois, três, quatro, cinco, seis. Galinha Pedrês.
Contos quase de fada que ele passa a relatar num rame rame surreal, tão rico em detalhes que faz parecer uma eternidade como se fizessem parte das mil e umas noites.
O tom monocórdio com que conta histórias num cenário delirante, ainda sob o efeito e a impressão do que viu, observou, viveu, quando enfurecido se transforma numa tonitruante pedrada mental fustigando por horas a fio (parecendo um desafio!) os ouvidos e as mentes de quem se encontra dentro do seu raio de alcance e que, não por acaso foi eleito para ser o alvo dessa saraivada. Ai meu Deus me salva!
E ele entra de tal forma no que está relatando que fica alheio e imune a tudo e nem consegue notar o desconforto, a impaciência de quem está sendo bombardeado pela sua verve delirante.
Na ânsia de nunca ficar de fora de nada que acontece, muitas vezes chega a usar de artifícios para estar em lugares para onde não foi diretamente convidado. De penetra, nunca se deixa pegar. Sempre tem um argumento salvador ou um gesto que legitima a sua presença. Um uísque, uma garrafa de vinho pode ser o passaporte para a calçada da fama. Ele então se inflama logo se sente em casa e, como posseiro, se instala e passa a dar palpite de mestre em tudo que vê, a promover mudanças na disposição das coisas buscando uma combinação de fatores que leve a um efeito positivo sobre a vida e o humor das pessoas. E o faz com tanta desenvoltura e naturalidade que da a impressão que foi contratado pelo dono da casa. Leva isso daqui. Não vê que não combina com nada, ta horrível, destoante. Deixa entrar a luz. Troca essa mesa de lugar... Vira para o outro lado. Esse jarro não tem nada a ver com esse ambiente. Não invente! É preciso agrupar coisas que têm a mesma energia! Olha a sinergia! Magia? Nada, ciência milenar. Não, tudo menos me chamar de decorador de interiores. Que horror! Sou um adepto da pura filosofia chinesa, baseada na observação da natureza. Com o feng shui você vai ter mais harmonia, sorte e fortuna na sua vida, pode crer amigo! Eu lhe digo.
Em um balcão de bar tomando um drink no point da hora num bar transado da Aldeota ou no Passeio Público entre amigos e colegas num sábado pela manhã uma feijoada comemorativa acredita que pode render longas e surpreendentes aventuras! Nunca se sabe. Por isso é bom estar sempre preparado para tudo que possa acontecer.
Passional odeia com a mesma facilidade com que ama. Cobre de elogios para depois mostrar os defeitos sem dó nem piedade.
Juras de amizade eterna podem ser imediatamente substituídas por injúrias quando pressente alguma atitude que não condiz com o que esperava.
Amante daquela idéia de que a verdade deve ser dita em qualquer situação, mesmo quando não se deseja, ele a usa como um dardo muitas vezes mortal que costuma lançar na cara das pessoas quando bem lhe apraz. Na paz!.
Faz e desfaz com a maior cara de pau. Quem hoje tem todo o seu amor, amanhã pode só merecer desprezo e indiferença.
Mas essa mesma volubilidade age no sentido oposto e o faz estar sempre em constante mutação de seus conceitos e opiniões sobre pessoas e coisas.
Num instante seguinte em que soltou impropérios contra o melhor amigo que o está desagradando pode voltar a cobri-lo de beijos.
Bem ao estilo de um palaciano das cortes francesas vive a arquitetar tramas maquiavélicas para que rolem cabeças. Sussurros ao pé do ouvido. Corredores mal iluminados. Recantos discretos são apropriados e apreciados por quem tece no silêncio e na escuridão.
Mas o seu lado estrela quer brilhar nas passarelas da vida e a fama e os aplausos o excitam e até o incitam a fazer da vida um jogo onde quem dá as cartas nem sempre é quem está por cima. Sente o clima.
Anima-se a cada nova descoberta de possibilidades. Veleidades! E viaja nas idéias de projetos milionários ainda em gestação. Projeta o mundo em sua imaginação como se da prancheta mental pudesse sair algo acabado, pronto para ser usado. Na pressa de viver tudo, atabalhoadamente passa do zero a cem num átimo de segundo, da mesma forma desacelera para no segundo seguinte estar a vinte e logo depois voltar ao ponto zero de onde partiu. Parece um Etna em erupção. Um tufão. Um trem-bala em ação. E nem se abala!.
Fala, fala pelos cotovelos. Como um novelo desenrolando a lã atropela quem ousa quebrar a sua monocórdia narração. Como um sussurro gutural fala para alimentar sua egocêntrica personalidade sem se importar com o efeito que isso possa estar causando em quem estiver sendo alvo dessa saraivada de palavras com que narra a sua saga vivida ainda a pouco no trajeto que fez de casa até aqui. Sai de mim abacaxi.
No taxi que teve de pegar, se queixa, porque ninguém lhe deu a deixa. Perdi o show la na praça, de graça. Também a amiga pão duro se recusou a lhe dar carona (é muito furona!) e, pra completar, ele esqueceu a carteira em casa e vai ter que perder tempo numa fila imensa. Não compensa. Melhor fazer um trato com o motobói despachante pra ir em seu lugar, pensa ele em voz alta. Pensando bem assim vou lucrar mais, pois enquanto ele vai lá, eu entro na galeria de arte de um amigo meu que fica no prédio ao lado e vejo a exposição de fotos que ele está promovendo enfocando os homens que passam na calçada da igreja, não param, não rezam, nem olham e seguem em frente. São ateus descrentes!
Demente, aposto que você não fez nada pra entrar nesse concurso! Eu bem que lhe disse, mas você só quer ficar aí parada, deitada nessa sua inércia! Confessa, você quer mesmo é ficar no bem bom do seu anonimato, que saco mulher, te mato!
Você nem sabe o que aconteceu...acho que vou ter que ir a Manaus pegar com a Belle o meu chapéu que comprei em Madrid, que ela levou no ano passado emprestado, não foi dado. E ela nem me devolveu. O gato comeu!
Como numa corda bamba, ele transita no limite entre aceitar a realidade mais aprisionante e alternar com outras formas que transcendem a linha tênue que separa os dois mundos, quando lhe convém. Não vem que não tem meu bem.
Irrequieto, entra, sai, vai la fora, pergunta a hora. Volta. Senta. Levanta. Toma mais uma caipirosca. Pode ser um vinho tinto. Uma vodca quem sabe. Tudo cabe pra ficar legal. Saca do celular...tecla alguns números...Que saco! Caixa postal de novo. Foi mal. É fogo!
Fica visivelmente impaciente. Parece dizer que ta na hora de saltar. Ir em busca de coisas novas...novos agitos! Fazer uma blitz noturna. Quer se dar bem. Mesmo sem vintém.
Num sábado à noite é um crime ficar em casa sem fazer nada... Com tanta coisa boa acontecendo la fora.
Isso aqui já deu o que tinha de dar. Ta chato! Vou embora. Vou descolar um babado. Algo mais agitado. Mais descolado. Mais cultural...um lual...um show ... quem sabe. Irado!
Prevendo o que pode acontecer, vai no toalete...descola um perfume que borrifa sem piedade por todo o corpo e pela casa. Como num ritual. Mais coisas do feng shui. Pensa que isso não influi? Influi e muito!
Me da uma carona aí? Como é não dá?! Ah ta... Obrigado. Deixa estar amiga, quem tem com que me pagar não me deve nada. Já ouviu falar?. Você vai ver. Essa foi por um triz!
Táxiiiiiiiiiiiiiiiiii
Fui...para mais um Luiz!
P.S. Vocês podem não conhecer esse meu Luiz e seus desdobramentos, mas com certeza já identificaram alguém no seu círculo familiar ou de amigos que se assemelha a ele. Um Luiz assim que, às vezes perturba, mas faz uma falta imensa quando não está por perto.
Nas reuniões e festas de amigos ele é fundamental para agitar as noites e espantar o tédio e a mesmice que costumam tomar conta desse tipo de evento.
SONHO DE UMA NOITE DE VERÃO
Fogo!
É fogo!
E foi tentando por fogo no relacionamento morno, quase gelado que ela quase incendiou a casa. Mas tudo o que conseguiu foi atrair a atenção dos vizinhos que entre solícitos e curiosos, aflitos com a fumaça que saia em profusão pelas janelas do apartamento, se apressaram em chamar os bombeiros para apagar o que pensavam ser um incêndio doméstico.
Fogo!
É fogo! É fogaréu.
De olho no céu!
É fogo!
È fogo sim, tentar manter a chama do amor acesa com o passar dos anos e em meio às dificuldades do dia-a-dia cheio de problemas e dificuldades.
E foi tentando por fogo no relacionamento morno, quase gelado que ela quase incendiou a casa. Mas tudo o que conseguiu foi atrair a atenção dos vizinhos que entre solícitos e curiosos, aflitos com a fumaça que saia em profusão pelas janelas do apartamento, se apressaram em chamar os bombeiros para apagar o que pensavam ser um incêndio doméstico.
E com isso apagaram um incêndio que nem chegou a começar e levaram de enxurrada os sonhos de uma noite de verão.
E alheia ao tumulto lá fora, aquela mulher empenhada em salvar o seu casamento ainda tentava fazer com que aquele marido tão convencional e medíocre, entendesse finalmente o que ela queria e decifrasse o significado de todo aquele aparato que tanto lhe custara a preparar e no qual ela pusera toda a esperança de que pudesse mudar o triste destino de uma relação que estava morta e onde ele, com a sua atitude de ignorar ou de notar com estranheza e deboche, estava acabando de enterrar, tão solenemente, a sua vida sexual e amorosa.
A camisola vermelha de lingerie parece não ter sido colorida o suficiente pra despertar a sua atenção. Nem as poses sensuais e provocantes tão cuidadosamente estudadas quando postas em prática, logo ao abrir a porta para ele, surtiram o menor efeito. Se ela fosse o toureiro o touro teria passado batido!
As rosas em pétalas escarlates derramadas pelo lençol de seda branco da cama ele esmagou todas com o seu corpanzil cansado e frouxo sem nem sequer notar o detalhe.
O som tocando músicas românticas escolhidas cuidadosamente para ajudar a criar o clima ideal foi desligado sem dó nem piedade por ele logo que entrou em casa. Sem tomar conhecimento do que estava rolando.
O extraordinário silêncio, fato completamente anormal tão cedo da noite na casa não foi suficiente para fazê-lo notar e estranhar a ausência das crianças, em quem a mãe dera uma canseira enorme durante todo o dia - escada acima - escada a baixo - para que fossem dormir mais cedo, como parte da estratégia geral do plano de resgate.
O jantar tão especial feito no capricho, conforme manda o figurino e seguindo à risca as dicas do Mais Você da Ana Maria Braga e o que já vira nos filmes, novelas e programas de TV foi digerido por ele como uma comida qualquer sem glamour. Sem nenhum elogio. Sem hummmm. Sem aquela de comer rezando. Sem um ai. Sem mais pra que. Sem mais saudade. Ele nem percebeu a pitada enorme de amor e desejo que ela pôs em cada ingrediente para apimentar o que andava completamente insosso feito chuchu.
Só as velas acesas que rodeavam a cama tiveram o poder de chamar a atenção do marido exausto e morto de sono. Mas não surtiram o efeito desejado. Não como ela queria. Muito pelo contrário. No seu afã de fazer as coisas do jeito mais eficiente e perfeito ela se esqueceu de providenciar cedo as velas. E quando lembrou já era muito tarde para comprar na forma e quantidade desejada. Assim teve que improvisar. Pediu ao filho que comprasse no mercadinho perto de casa todas que encontrasse. E então foram as velas comuns acesas e dispostas em volta de toda a cama que tanto chamaram a atenção e irritaram o seu marido, que perguntou entre irônico e abusado: - Da ao menos para apagar uma parte dessas velas para que eu possa me deitar. Estou exausto de tanto trabalhar. O dia hoje não foi moleza.
E foram também a fumaça e o cheiro que elas exalaram responsável pelo tumulto lá fora.
E foram também a fumaça e o cheiro que elas exalaram responsável pelo tumulto lá fora.
O apelo da urgência no estabelecimento da rotina diária foi mais forte que qualquer apelo sensual e romântico e nada foi capaz de despertar a libido desse marido estraçalhado pelo imediatismo das coisas materiais urgentes, na luta desigual e insana pela sobrevivência física que rouba as energias e embota a capacidade de sonhar.
E ainda sem se dar conta do que estava sucedendo ela contrariada teve que atender às pancadas fortes e urgentes na porta do apartamento e os gritos aflitos da vizinha chamando seu nome. Espero que seja alguma coisa muito importante para ela vir atrapalhar assim os meus planos, pensou ela ao se dirigir à porta. E qual não foi sua surpresa quando esta, a se ver frente a frente com ela, perguntou ansiosa, mas já um pouco aliviada onde era o fogo e se ela e as crianças estavam bem.
Tão empenhada estava que nem percebeu o barulho dos bombeiros lá fora se preparando para agir nem o burburinho das vozes curiosas que foi chegando até ela ao abrir a porta da frente e a visão de muitas cabeças tentando assomar o apartamento para ver de perto o que estava acontecendo, na esperança de uma tragédia iminente para contar para os que não tiveram acesso.
Tudo isso despertou a nossa romântica senhora do seu sonho para fazê-la cair de novo na dura realidade da sua vida onde o glamour e a sofisticação soam como sinal de perigo para quem vive às voltas com o urgente e catastrófico no lado mais cruel e cinzento da vida. onde vela serve para suprir a falta de luz. Fumaça é sinal de fogo. Fogo é perigo de incêndio que destrói barraco. Água é artigo sempre escasso. Água demais é prenúncio de inundação e tragédia. E o coração que vive em sobressaltos não consegue sossegar e sonhar. E a mente presa à azáfama do dia-a-dia não consegue ir além da imaginação.
Fogo!
É fogo! É fogaréu.
E la está ela de volta pro seu fogão, seu tanque de roupa, sua pia de prato, assumir o seu papel, Rapunzel, eternamente confinada no seu castelo de areia, sem direito a lua de mel.
De olho no céu!
domingo, 28 de fevereiro de 2010
DE VOLTA PARA O FUTURO
De repente
Era o futuro
Vestindo as mesmas roupas
De passado
Buscando uma saída
Para o presente
Do meu pretérito
Mais que
Imperfeito.
domingo, 14 de fevereiro de 2010
(IN)DECISÃO
ATÉ SABER
O QUE FAZER
DA VIDA
ATÉ DECIDIR
COMO VIVER
A VIDA
ATÉ SE ACOSTUMAR
COM A IDÉIA
DA MORTE
ATÉ APRENDER
O VALOR
DE CADA MOMENTO
ATÉ APRENDER
A SE JOGAR
DE CABEÇA
MUITA VIDA
FOI PERDIDA
NO MEDO
O QUE FAZER
DA VIDA
ATÉ DECIDIR
COMO VIVER
A VIDA
ATÉ SE ACOSTUMAR
COM A IDÉIA
DA MORTE
ATÉ APRENDER
O VALOR
DE CADA MOMENTO
ATÉ APRENDER
A SE JOGAR
DE CABEÇA
MUITA VIDA
FOI PERDIDA
NO MEDO
O OUTONO DA MATRIARCA
Pelo caminho enquanto tudo ia passando vertiginosamente, na ansiedade da chegada e no medo do que iríamos enfrentar, olhei para cima. Surpresa e exultante vi que do céu, em brancas nuvens, ela sorria para nós e nos soprava um beijo daquele jeito que lhe era tão peculiar!
Para em seguida abrir as asas sobre nós e voar leve e solta como a grande mensageira branca derramando paz e amor em nossos corações, para que pudéssemos suportar o fardo pesado de aceitar a sua partida tão repentina e que todos acreditavam nunca fosse acontecer.
Mas aconteceu. O nosso símbolo de imortalidade, a nossa fonte de juventude secou. Nossa imortal Tia Grande com os seus decantados e bem vividos noventa e três anos, de que tanto se orgulhava e que pareciam lhe garantir esse status mostrou-se em toda a sua humanidade e feneceu.
Como uma flor em plena primavera ela surpreendeu e contrariando todos os prognósticos e frustrando todos os prematuros planos dos que lhe amam e egoisticamente queriam tê-la para sempre ao lado, bateu asas e voou para outra estação. Para o outono, o outono da matriarca.
Como uma flor em plena primavera ela surpreendeu e contrariando todos os prognósticos e frustrando todos os prematuros planos dos que lhe amam e egoisticamente queriam tê-la para sempre ao lado, bateu asas e voou para outra estação. Para o outono, o outono da matriarca.
É certo que a saudade ficou em nós. Para sempre as lembranças boas vamos cultuar. As suas tiradas engraçadas e irreverentes ainda vão ser repetidas nas rodas de conversas, nas mesas de bares onde houver uma cervejinha gelada e um prato de batatas fritas, bem ao seu estilo.
E assim, como a tradição popular a história gloriosa de uma pessoa que soube como ninguém conquistar o amor, a admiração e a simpatia de todos que com ela tinham o prazer de conviver vai ser transmitida de geração em geração até virar lenda, a lenda de uma mulher imortal que viveu na cidade de Martins uma vida plena, cheia de vigor e alegria.
Uma mulher que tinha quase cem anos e pensava e vivia como uma jovem madura de trinta mas com a cabeça voltada para o futuro e antenada no presente, uma cidadã de um mundo globalizado capaz de acompanhar toda a evolução tecnológica.
E a sua gargalhada, que marcou de forma tão definitiva a sua personalidade, vai se eternizar em cada um de nós e continuar ecoando pelas ruas de Martins como um chamamento para a alegria e a felicidade por muito tempo ainda, enquanto houver um coração sensível para escutar e entender o seu significado.
O corpo de noventa e três anos traiu o espírito jovem que fazia planos para um futuro próximo, quando chegaria a comemorar um século de vida, que era o seu maior orgulho.
E deixou nos corações dos que a amam a certeza de que muito ainda tínhamos para lhe falar e principalmente muito a aprender com a sua sabedoria.
As lições de vida com certeza nunca esqueceremos. E feliz de quem souber delas tirar proveito para viver não importa quantos anos, e se imortalizar no coração de alguém como ela o fez com milhares de pessoas que nunca deixarão de lembrá-la e amá-la. Para sempre. Eternamente. Até que voltemos a nos encontrar num outro plano para muitas gargalhadas juntas.
Cessou o tempo do choro. Uma nova estação. Voltou a primavera.
Alegria. Alegria. Amável alegria.
Até lá minha tia xará. Orgulho do meu nome. Espelho da minha vida
quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010
Anjo torto
Naquele tempo eu não conseguia entender que “linhas tortas” eram essas por onde Ele escrevia certo. Se o certo nem sempre aparecia e só ficavam evidentes os tortos? Aí eu me angustiava e pensava comigo:
Não seria melhor então que Ele escrevesse torto sobre linhas retas...quem sabe assim muitas coisas erradas pudessem dar certo?
O torto e o certo.
O reto e o errado.
Nesse caso a ordem dos fatores deveria alterar o produto ou não?
Essa dicotomia recorrente aparecia em tudo que eu via e assistia olhando o mundo la fora.
Aquele barraco pendurado no alto do morro prestes a desabar...será que ele não podia consertar?
O certo seria deixar como está para ver como é que fica?
Nesse caso, pode-se presumir que o torto seria tentar consertar...(?)
Desentortar o barraco...aprumar o morro...certo...errado.
Algo está fora de lugar.
Mas ouvi dizer...tudo tem sua razão de ser.
Faz parte de um plano maior.
Divino e misterioso.
Você não pode saber.
Você não precisa entender
Você ainda vai ver.
É muito maior que você!
Não é preciso ver pra crer
Há de ter fé, São Tomé!
As perninhas finas e tortas do menino correndo desajeitado atrás de uma bola de meia pelos campos do Senhor.
O bucho grande e sujo, cheio de vermes, das crianças com carinhas tristes de fome, nas portas das casas dos subúrbios das periferias confusas, das nossas metrópoles, megalópoles desumanas. Insanas.
A cabeça grande demais em cima de corpinhos mirrados, fragilizados pela desnutrição. Que judiação.
A boca ávida e torta num esgar de fome.
Em nome de que?
E a justiça cega que não vê!
O dedinho torto e enrugado de tanto chupar.
Os dentes podres e tortos.
O nariz torto sempre escorrendo.
Os olhinhos tortos, remelentos.
As ruas tortas, lamacentas.
As vidas tortas e perigosas, que escondem armadilhas em cada curva.
As mortes tortas e dolorosas.Essas é que são as famosas linhas?
E as escritas certas...onde e quando vamos encontrar?
Inclemente
Se eu tivesse que te definir
Como companheira
(De trabalho)
Diria que és um mal necessário
Mal
Porque represas
A enxurrada da minha criação
Necessário
Porque dosas a sua vazão
Por isso
Às vezes
Me agasto contigo
Te xingo
Outras
Te quero
Te necessito.
Como companheira
(De trabalho)
Diria que és um mal necessário
Mal
Porque represas
A enxurrada da minha criação
Necessário
Porque dosas a sua vazão
Por isso
Às vezes
Me agasto contigo
Te xingo
Outras
Te quero
Te necessito.
Sede de viver
Na mão que lava
O chão de cada dia
O pão que mata a fome
Mas não sacia
A sede de vida e prazer
Que explode no peito
E morre na garganta
Seca de tanto gritar
E não ser ouvida
Perdida no anonimato
O fato é que perdemos
A hora e a vez de protestar
Testar o nosso poder
Na voragem de buscar
Com coragem e destemor
O tempo que nos foi roubado
Sem pudor!
O chão de cada dia
O pão que mata a fome
Mas não sacia
A sede de vida e prazer
Que explode no peito
E morre na garganta
Seca de tanto gritar
E não ser ouvida
Perdida no anonimato
O fato é que perdemos
A hora e a vez de protestar
Testar o nosso poder
Na voragem de buscar
Com coragem e destemor
O tempo que nos foi roubado
Sem pudor!
Impotência
Vejo você sumir na curva da estrada
Que se estreita
Se fecha
Engolindo os sonhos
De uma noite cálida
Vejo você passar
Pro lado de lá da vida
Que espreita
Pela fresta
Onde mora a tristeza
De uma noite pálida
Na escuridão
Vendo a solidão se instalar
No quarto escuro do medo
Tão cedo pra se deixar naufragar
Nas ondas turbulentas
Da incompreensão
Nos caminhos tortuosos e perversos
Dos desencontros do reverso do amor
Presa a tanta coisa sem sentido
Deixo os desatinos da vida
Roubar a minha paz
E me sinto incapaz
De mudar esse destino.
Que se estreita
Se fecha
Engolindo os sonhos
De uma noite cálida
Vejo você passar
Pro lado de lá da vida
Que espreita
Pela fresta
Onde mora a tristeza
De uma noite pálida
Na escuridão
Vendo a solidão se instalar
No quarto escuro do medo
Tão cedo pra se deixar naufragar
Nas ondas turbulentas
Da incompreensão
Nos caminhos tortuosos e perversos
Dos desencontros do reverso do amor
Presa a tanta coisa sem sentido
Deixo os desatinos da vida
Roubar a minha paz
E me sinto incapaz
De mudar esse destino.
Bodas de Papel
Essa aí
Que hoje comemora o primeiro aninho
Parece tão frágil
Que dizem ser de papel
Mas é uma menina levada
Quer criar asas e voar
Antes mesmo de engatinhar
Nasceu ousada
Crivada de preconceitos
De feitos e defeitos
De erros e concertos
E precisa a toda hora de acertos
Para consolidar
O que está feito
E que veio para ficar
Mas cresceu forte
Tão robusta que às vezes assusta
Pela força de resistir
Pelo poder de transformar
Pela capacidade de juntar
Unir o velho novo
E embaralhar as coisas
Como se desse as cartas da vida
Para mudar destinos incertos
Que queriam retos
Em linhas tortas
Dispostas em desenhos mágicos
Embora não tão lógicos
Como era de se esperar.
Que hoje comemora o primeiro aninho
Parece tão frágil
Que dizem ser de papel
Mas é uma menina levada
Quer criar asas e voar
Antes mesmo de engatinhar
Nasceu ousada
Crivada de preconceitos
De feitos e defeitos
De erros e concertos
E precisa a toda hora de acertos
Para consolidar
O que está feito
E que veio para ficar
Mas cresceu forte
Tão robusta que às vezes assusta
Pela força de resistir
Pelo poder de transformar
Pela capacidade de juntar
Unir o velho novo
E embaralhar as coisas
Como se desse as cartas da vida
Para mudar destinos incertos
Que queriam retos
Em linhas tortas
Dispostas em desenhos mágicos
Embora não tão lógicos
Como era de se esperar.
segunda-feira, 4 de janeiro de 2010
RETRATO DE FAMÍLIA
“Na fotografia estamos felizes”
Não se ouvia nenhum ruído estranho
Nenhum acorde dissonante
que ameaçasse quebrar a sintonia
daquela enésima sinfonia familiar
Nenhum acorde dissonante
que ameaçasse quebrar a sintonia
daquela enésima sinfonia familiar
A fotografia precisa ser feita
esse momento tem que se eternizar
esse momento tem que se eternizar
Vá buscar a máquina
Seja rápida! Não deixe passar o efeito
Desse momento único Mágico
Vamos façam pose
Empinem o nariz
Xiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiis
Click
Está pronta
Precisa se revelar para o mundo
todo mundo junto
Unido
Feliz
Nem que esteja por um triz
A mentira precisa ganhar pernas
Para que a verdade não consiga vir à tona
Pra não desfazer a ilusão
Tão cuidadosamente construída
Bem nutrida
Na imagem ilusória
Que por tanto tempo alimentou
E teima em querer se revelar
Hoje não
Deixa tudo como está
Essa noite é feita para mistificar
Iludir enganar
Consolidar a mentira
Como verdade entronizada
No retrato da ceia
Santa da noite feliz!
A família está completa
Mesmo que falte um
Não importa. Disfarça.
Nem dá pra perceber!
Em completa paz
Pai, mãe
Filhos e filhas
Netos e netas
Até que enfim!
Harmonia aparente
De parentes
Ausentes o ano inteiro
Agora presentes
Em pacotes bem feitos
Que causam o efeito desejado
Esperado!
Pessoas que quase não se vêem
Quase não têm assuntos
Agora todos juntos
Assim dispostos em poses preconcebidas
Para serem percebidas
Que beleza!
Vai ficar em exposição
Para que todos vejam
Como são felizes
Emoldurada como convém
Num quadro pendurado
Na parede do corredor
Galeria particular de cada um
Ou num porta retrato
Na mesinha de centro da sala
Não ficou uma graça?
Não abala?
No criado mudo do quarto
Aqui
Ali
Acolá
Em qualquer lugar
O que vale é mostrar pra todos
Bobo!
Está pronto o retrato perfeito da hipocrisia
Que move o mundo
Oprime os corações
Embota as mentes
Dementes
Tementes
Adeus
Até o próximo Natal
É fatal!
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